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Retrospectiva 2023: Público voltou aos teatros neste ano | Eu &

Retrospectiva 2023: Público voltou aos teatros neste ano | Eu &

Inspirado no livro “Sapiens”, a peça “Ficções”, com Vera Holtz, teve temporada esgotada — Foto: Ale Catan/Divulgação

Em agosto de 2021, começou uma lenta retomada das atividades presenciais nos teatros depois da paralisação causada pela covid-19, em março do ano anterior. Esse recomeço, repleto de protocolos sanitários, se prolongou pelo ano de 2022 e, mesmo com o aumento das ofertas em cartaz e os evidentes efeitos da vacinação, o público demonstrou cautela em seu retorno às casas de espetáculos.

Foi em 2023 que os artistas ocuparam os palcos diante de plateias realmente lotadas e dispostas a participarem sem medo das experiências culturais. O espetáculo “Ficções”, protagonizado por Vera Holtz com base no livro “Sapiens – Uma breve história da humanidade”, de Yuval Noah Harari, estreou em setembro de 2022 discretamente no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, e estourou com temporada no Teatro Faap, em São Paulo, totalmente esgotada entre janeiro e março.

Depois disso, a atriz correu várias capitais, voltou ao Rio em uma sala de 900 lugares, já foi vista por mais de 67 mil espectadores e tem a agenda fechada até o fim de 2024.

Em março, Holtz foi uma das estrelas do Festival de Teatro de Curitiba, que, depois do retorno em 2023, bateu os próprios recordes neste ano. Mais 200 mil pessoas marcaram presença nas 350 atrações oferecidas pelo evento paranaense. As 41 sessões da mostra principal, aquela que traz as novidades e as montagens que repercutiram no ano anterior no país, registraram lotação com antecedência inédita.

“Helena Blavatsky, A Voz do Silêncio”, com Beth Zalcman, fez sucesso em versão digital e também na versão presencial — Foto: Divulgação

“As pessoas ficaram mais à vontade para se verem, a fobia da aglomeração caiu, e o festival é um reconhecido ponto de encontro”, diz Fabíula Passini, umas das diretoras do evento. “O crescimento do público também foi reflexo de uma programação abrangente e voltada para espectadores diversos, inclusive aqueles que não frequentam ou deixaram as salas de espetáculos.”

Nesta época, o musical “Mamma Mia”, dirigido por Charles Möeller e Claudio Botelho, já era fenômeno no Teatro Multiplan, no Rio de Janeiro, desde 2 de fevereiro. Foram 60 mil espectadores em 73 apresentações. Na capital paulista, as oito sessões na casa de shows Vibra São Paulo receberam 25 mil pessoas, segundo Botelho, batendo o recorde dos shows do cantor Roberto Carlos.

“Existia uma vontade represada do público, mas 2022 foi marcado por um excesso de estreias e muitas passaram despercebidas”, afirma Botelho. “O ano de 2023 deixou a pandemia no passado, marcando a retomada não só do teatro, mas do comércio, eventos e serviços em geral.”

“A Herança”, épico que retrata diferentes gerações da comunidade LGBTQIA+ nos Estados Unidos, é um exemplo de espetáculo que furou a bolha e atingiu diferentes plateias. “Abrimos as bilheterias com 4.000 ingressos vendidos na primeira semana”, conta o ator Bruno Fagundes, produtor do projeto e protagonista junto de Reynaldo Gianecchini.

Os bilhetes para todas as sessões do Teatro Vivo, com capacidade para 274 pessoas, em São Paulo, de 8 de março a 30 de abril, se esgotaram em menos de um mês. A montagem seguiu para o Teatro Raul Cortez, com o dobro de poltronas, entre junho e agosto, e chegou ao Rio de Janeiro, em setembro e outubro, fechando o ano com 34.000 pagantes. “O público estava ávido por experiências coletivas e se emocionou com uma boa história”, justifica Fagundes.

O espetáculo “Tom na Fazenda”, lançado em 2017, voltou com fôlego renovado depois da pausa pandêmica e teve uma bem-sucedida carreira na França alavancada pela participação no Festival de Teatro de Avignon. O texto do canadense Michel Marc Bouchard, protagonizado pelo ator Armando Babaioff, contabiliza quase 50 mil pagantes em 140 apresentações apenas neste ano no Brasil em uma rara demonstração de persistência para se segurar em cartaz.

“Um trabalho é feito de continuidade e vejo ‘Tom na Fazenda’ como uma empresa que precisa de saúde financeira para se manter”, afirma o produtor Sérgio Saboya. “É um projeto cultural consumido pelo público que necessita de gestão, planejamento e objetivo.”

Também produzido por Saboya, “Tráfico” é um exemplo de peça de pequeno porte que se mantém pela bilheteria. O monólogo, interpretado por Robson Torinni, sobre um garoto de programa e matador de aluguel, atravessou o ano, em grande parte, em uma sala de 46 lugares, o Teatro Poeirinha, no Rio, com sessões lotadas, atingindo 6.200 espectadores — o que pode parecer pouco, mas não é. “A sustentabilidade não está no patrocínio e sim em jamais parar de investir”, diz Saboya, sobre a montagem que chega a São Paulo no próximo ano.

Uma trajetória curiosa foi construída por outro solo, “Helena Blavatsky, A Voz do Silêncio”, com a atriz Beth Zalcman, que, lançado em versão digital na pandemia, estreou presencialmente em janeiro no Teatro B32, em São Paulo, e superou 30 mil espectadores no ano. O diretor Luiz Antônio Rocha acredita que o boca a boca é um dos responsáveis pelo sucesso.

“O público online chancelou a peça que já tinha uma trajetória quando chegou aos palcos e muita gente voltou mais de uma vez a vê-la”, diz. Para ele, apesar de as pessoas estarem excessivamente conectadas tecnologicamente, surgiu uma necessidade do encontro coletivo depois do confinamento. “Houve um reconhecimento da população a respeito da importância da cultura no cotidiano, e o teatro faz parte como agente transformador”, declara Rocha. “A pandemia nos mostrou que não existe vida sem arte.”

Post original através de https://valor.globo.com/google/amp/eu-e/noticia/2023/12/24/retrospectiva-2023-publico-voltou-aos-teatros-neste-ano.ghtml:

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