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Protagonista de ‘Mundaréu de mim’ fala sobre racismo, oportunidades e São Gonçalo | Papo Reto

Protagonista de ‘Mundaréu de mim’ fala sobre racismo, oportunidades e São Gonçalo | Papo Reto

Sara Chaves tem apenas 24 anos, mas bastante história para contar. A atriz e cantora, que saiu de São Gonçalo em busca de mais oportunidades artísticas, protagoniza o maior espetáculo de teatro a céu aberto do país, “Mundaréu de mim”, que tem todo um misticismo em torno do carnaval. Neste Papo Reto, ela fala de protagonismo preto, sonhos e novos projetos a serem realizados.

Conte, por favor, como foi o início da sua trajetória na dramaturgia?

Comecei a fazer curso de teatro com 10 anos, em Niterói. Meus pais contam que o interesse pela arte cênica veio desde criança, quando perguntava como fazia para “entrar na televisão”. Então, buscamos uma agência de atores e fiz meu primeiro material fotográfico. Mesmo com pouca idade, tinha uma consciência de que teria que estudar bastante sobre história mundial do teatro, dramaturgos, teorias, bases do teatro. Com isso, participei de muitos cursos, inclusive de O Tablado. Até que, com 18 anos, comecei a graduação em artes cênicas na faculdade CAL, que abriu diversas possibilidades, oportunidades e ensinamentos. Tive grandes mestres que me ajudaram em todo processo de formação como atriz. Porém me encontrei de fato no teatro musical, juntando três áreas que amo: teatro, música e dança. Foi com o musical “O despertar da primavera”, da dupla Moeller e Botelho que ingressei no mercado e não pretendo parar. Sempre tive uma certeza muito concreta no coração que queria ser atriz, que o caminho seria longo mas que daria certo.

Considera que ainda é muito difícil para quem tem vocação artística em São Gonçalo, e em outros lugares não tão bem atendidos pela cultura, ter acesso a formação e oportunidades?

Acho que hoje em dia quem quer estudar teatro tem mais possibilidades. Vejo muitas iniciativas de incentivo à arte, projetos sociais gratuitos que promovem o acesso à cursos de teatro, dança, música para quem é de fora, assim como eu. Mas há uma migração que ainda é inevitável, de ter que ir a capital, para a formação acadêmica, para mais oportunidades de trabalho na área artística, pois é onde estão concentrados as casas de show, grandes teatros e eventos culturais. Quando comecei a fazer teatro, busquei cursos e aprimoramentos em Niterói e na cidade do Rio, que tinham uma estrutura melhor para o que estava buscando. São Gonçalo é uma cidade com artistas brilhantes, completos, talentosos! Com projetos artísticos crescendo cada vez mais, acredito que revelará grandes nomes.

Recentemente, todos ficaram encantados com o protagonismo negro no grande sucesso “Vai na fé”. Atrizes como Clara Moneke, praticamente uma estreante nas telas, e Sheron Menezzes brilharam. Acha que isso é um baita estímulo para quem está vindo agora?

Com certeza é um estímulo para jovens atores pretos essa mudança de olhar na escolha de elenco. Mudanças positivas, pensando na inclusão e representatividade em meios de comunicação que influenciam a vida e pensamento das pessoas. É de extrema necessidade ligar a TV e se sentir representado, se identificar com a história que está sendo contada. Mas, principalmente, é importante ver que é possível chegar a um lugar de protagonismo preto, sem ser com personagens estereotipados. Fico feliz com as oportunidades que a emissora está dando para artistas brilhantes dessa geração. É uma luta já antiga, mas que não se pode dar por vencida. Ainda há muitos desafios para serem enfrentados. Mas é uma conquista ver tanta gente preta talentosa junta e ganhando seus espaços.

Como é sua personagem em “Mundaréu de mim”? E o espetáculo em si?

A Graciela me fez voltar a ser criança. Nós somos parecidas em muitos aspectos. Gosto de dizer que a Graciela sempre esteve em mim, e fui descobrindo essa menina de 10 anos a cada cena. É minha primeira protagonista da vida e me sinto representando tantas histórias, vivências de crianças pretas. Graciela é uma criança doce, esperta e que sonha em viver uma aventura de carnaval. Ela cresceu sem conhecer o pai, querendo viver uma grande aventura de carnaval e com isso, se entender. Ela é extremamente madura para a idade. O espetáculo introduz para muitas crianças o tema “morte” de maneira leve, divertida e lúdica. “Mundaréu de mim” é um espetáculo que fala sobre saudade, morte e carnaval. Todo ano, durante o carnaval e na Quarta-feira de cinzas, as pessoas que já foram para outro plano – mas não morreram, “viraram saudades” e podem voltar a caminhar entre os vivos, uma vez que na multidão e com fantasias não serão vistas.

A magia do carnaval contamina você? Qual sua ligação?Sempre dizia que não gostava de carnaval. Talvez pela aglomeração de pessoas na rua ou pelo receio de ser furtada. Por mais que amasse samba e outros ritmos brasileiros, nunca fui o tipo de pessoa de acompanhar bloco. Mas é impossível não se apaixonar por essa mistura de cores, brilhos, jeitos, sabores que é o carnaval. Já tem uns anos que sou contaminada pela magia do carnaval, que assisto os desfiles de escola de samba (mesmo que de casa) e que vou as ruas celebrar a vida. Depois de “Mundaréu de mim”, percebi que o carnaval é um respiro no meio do caos. É a liberdade de se fantasiar, de ser quem quiser e festejar os (re)encontros. Acredito que ano que vem estarei junto as minhas saudades vivendo intensamente os cinco dias de folia (rs).

Quais suas lembranças da participação no “The voice kids”?Lembro que estava acompanhando a edição do “The voice kids” da qual que participei. Nem cogitava a possibilidade de poder trabalhar como backing (vocal) naquele ano (2019). Foi uma surpresa incrível! Uma amiga da faculdade artes cênicas da CAL me indicou na época para fazer backing para os candidatos. Fui ao Projac para audicionar (fazer teste), e foi tudo muito rápido. Eu e ela acabamos participando do programa juntas. Minha família vibrou comigo em todo processo, desde a ligação até o dia do programa ao vivo. Pude conhecer os candidatos mais de perto, criar laços e tem alguns que até hoje acompanho a trajetória. Por mais que tenha sido um dia, só foi uma experiência maravilhosa que me deu bagagem para tantos outros trabalhos.

Post original através de https://extra.globo.com/brasil/papo-reto/coluna/2023/12/protagonista-de-mundareu-de-mim-fala-sobre-racismo-oportunidades-e-sao-goncalo.ghtml:

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