Claudia Raia encerra temporada no teatro como Tarsila do Amaral e conta desafios da volta ao trabalho | TV & Famosos
Quando um desafio é dado a Claudia Raia, ela vai lá e supera as expectativas. O mais recente foi o convite para viver a pintora Tarsila do Amaral no musical “Tarsila, a Brasileira”, em cartaz por quatro meses em São Paulo com sessões esgotadas. No Rio, o espetáculo chega ao último final de semana da temporada no domingo (2).
Ao se entregar à personagem e se despir, literalmente, Claudia se apaixonou, aprendeu e se inspirou na artista do movimento modernista. A dona da obra famosa “Abaporu” tem várias particularidades desconhecidas pelo público e reveladas durante a sessão.
Claudia Raia explica espetáculo inspirado em Tarsila do Amaral
“Costumo dizer que Tarsila era um vulcão em contenção, e muito da força dela vinha disso, de como ela fazia força para conter tudo dentro de si. Ela exercia sua liberdade nesse lugar: viver como queria viver. Isso é uma grande inspiração para mim, que sempre fiz da liberdade a minha bandeira”, explica.
Ao gshow, a atriz conta que precisou deixar de lado sua postura ereta de bailarina, revela que se emocionou no palco, fala de liberdade sexual e desmistifica a nudez após a maternidade. Mãe do pequeno Luca, de 1 ano, de seu casamento com Jarbas Homem de Mello, com quem divide o espetáculo, ela explica como tem conseguido dar conta de tudo.
“Uma coisa que eu entendi é que, apesar de não poder estar sempre com Luca, queria estar inteiramente com ele nos momentos em que era possível. E foi assim que construímos nossa rotina.”
A seguir, uma entrevista com a Claudia Raia, na pele de Tarsila, e também um papo sincero com Maria Claudia, mãe de Luca, Enzo e Sophia e mulher multifacetada quando a cortina se fecha.
“Foi intenso. Ficamos quatro meses ensaiando antes de entrar em cena. Tarsila é uma mulher muito diferente de mim, tanto fisicamente, quanto emocionalmente. De fato, a parte do corpo, de encontrar aquela postura, o tom de voz, o manejo da cabeça… Tudo isso foi bastante desafiador. Ela tinha ombros mais curvados, um olhar mais baixo, a voz mais comedida. O extremo oposto de mim, que tenho postura de bailarina, muito extrovertida e adoro falar.”
“Costumo dizer que, nos ensaios, eu amarrava a Claudia para que a Tarsila pudesse chegar. Mas às vezes a Claudia escapava. E eu dizia a mim mesma: ‘Agora não é hora disso, fica aí quietinha’. (risos).”
“O segundo ato do espetáculo é muito emocionante. A carga dramática dele é muito intensa. É o momento em que conhecemos sobre as perdas dessa mulher em que ela desmonta. Viver isso no palco é muito intenso. Mas eu acho que é muito necessário também para entendermos tudo que essa mulher perdeu ao longo da vida.”
“Conhecia mais a obra de Tarsila do Amaral. Sobre ela mesmo, sempre tivemos poucas informações. Quando a Tarsilinha, sobrinha-neta da Tarsila, me procurou para fazer o projeto, ela disse que queria mostrar o lado B da tia, justamente esse lado que sempre foi muito preservado pela família. Isso me instigou mais ainda a contar essa história.”
“As pessoas saíam daqui procurando saber mais sobre Tarsila, Oswald de Andrade, Mario de Andrade, Anita Malfatti, o Grupo dos 5, sobre o modernismo brasileiro… Isso sim é cumprir meu papel como artista, acrescentar algo para quem vem nos assistir. Me comoveu muito o quanto as pessoas diziam que tinham orgulho de serem brasileiras depois de assistirem ao espetáculo.”
A liberdade sexual de Tarsila
“Tarsila é um exemplo de liberdade. Apesar de viver em um sociedade extremamente punitiva para mulheres, que não permitia que elas desejassem ou escolhessem, Tarsila conseguiu viver como desejava. Separou-se do primeiro marido – com uma anulação do casamento no Vaticano, coisa raríssima nos dias de hoje, imagina naquela época. Estudou pintura, morou em Paris, casou-se com Oswald, viveu esse trisal com ele e Pagu – essa é a versão que a família dela conta, não foi algo que criamos para colocar no espetáculo. Foi traída pelos dois, separou-se e se casou depois com Luís, um homem bem mais novo do que ela e depois foi trocada pela sobrinha…”
“Tendo esse olhar hoje para a história dela, podemos entender que Tarsila era uma mulher que, apesar das convenções, buscava encontrar as brechas possíveis para viver da sua maneira. Ela exercia sua liberdade nesse lugar: viver como queria viver. Isso é uma grande inspiração para mim, que sempre fiz da liberdade minha bandeira.”
“No meu caso, não é uma possibilidade fazer um trisal. Gosto de como minha relação é, funciona para mim e para o Jarbas. Estou feliz e realizada desta maneira. Mas isso faz sentido para mim. Quando falo isso, não exerço nenhum julgamento. Cada uma sabe o que faz bem para si. As pessoas precisam buscar o que faz sentido para elas.”
“Sou produtora, quando vejo, já estou produzindo a vida das pessoas ao meu redor. Mas é um lugar muito natural para mim. Sou uma pessoa que gosta de cuidar. Acho que onde me desconstruo, quase que literalmente, é em casa. Sentada no chão brincando com o Luca, falando sempre com Sophia por chamada de vídeo, tomando café com Enzo e ouvindo as novidades dele, aproveitando um dia de folga com Jarbas. Em família é quando eu tiro tudo.”
“Sai de cena a Claudia Raia e entra em cena a Maria Claudia. Não que as duas se separem, porque serei sempre eu. Mas esse é um momento em que há um limite mais bem delimitado entre o pessoal e o profissional, sabe?”
“Eu me inspiro muito no amor da Tarsila pela cultura, nessa vontade de criar e incentivar a arte brasileira. Somos um país tão rico, tão plural, com tantas manifestações artísticas maravilhosas. Me inspiro na liberdade dela, nessa vontade de viver… De viver como quer apesar do que os outros vão dizer, de não se curvar às expectativas ou ao que dizem.”
“Se eu pudesse encontrá-la? Nossa, é tanta coisa que eu gostaria de falar. Acho que eu agradeceria porque ela ser quem ela é, viver da maneira que viveu e seguir nos inspirando.”
“Em São Paulo, Luca ia nos visitar entre as sessões de sábado e as de domingo. Ele já assistiu ao espetáculo da coxia também. E sempre fica quietinho, em silêncio, prestando atenção. No Dia das Mães, me fizeram uma surpresa e ele entrou no final. Nem consegui agradecer depois. Fiquei tão emocionada! Aqui no Rio ele vem conosco, sim. No camarim, não temos grandes adaptações, porque quando dá a hora de ele dormir, por exemplo, ele já vai para casa. Ou, no caso do Rio, para o hotel. Ele fica conosco o máximo de tempo que dá. A equipe também adora as visitas dele.”
“Sempre que eu conseguia, estava em casa e aproveitava os momentos com ele. Uma coisa que eu entendi é que, apesar de não poder estar sempre com ele, queria estar inteiramente com ele nos momentos em que era possível. E foi assim que construímos nossa rotina.”
“Quando precisava marcar algo, preferia sempre que fosse no horário em que ele estivesse dormindo. Assim dava para ficar com ele quando voltasse. Eu construí uma rede que está comigo nesse dia a dia para fazer tudo dar certo. Não tinha como ser diferente. Mas sempre que dá, ele está conosco. Desde os ensaios era assim.”
“Não sei se a palavra certa é desapego. Amo trabalhar e me realizar nesse aspecto me torna, inclusive, uma mãe melhor. Voltar a trabalhar foi fácil? Não foi. Mas eu sabia que era importante para mim e que a gente se organizaria para fazer dar certo. Foi como fizemos. Hoje, com a tecnologia, é um pouco mais fácil. Entre um intervalo e outro, quando Luca não estava conosco no ensaio, a gente fazia chamada de vídeo para matar a saudade.”
“Não vivi isso só na gravidez. Foi na gravidez também. Mas é impressionante a quantidade de pessoas que falam ainda sobre não ter idade para isso, não ter idade para aquilo, que eu não posso me vestir de uma certa maneira, que eu tenho que me dar ao respeito, que meu cabelo é comprido demais para minha idade… Amor, como assim? Eu posso sim. Eu posso o que eu quiser e conseguir fazer. Não aceito esse tipo de limitação.”
“Por que, ainda hoje, quando uma mulher se relaciona com um homem mais novo isso é uma questão? Se fosse o contrário, seria também? Por exemplo, fui julgada durante a gravidez, mas não vi Jarbas sendo apontado da mesma forma. Pelo contrário, as pessoas sempre o parabenizam. Mas então não pode ser mãe depois dos 50, mas ser pai pode? São questões que eu tenho e que sempre divido nas minhas redes sociais porque a gente não pode simplesmente aceitar que é assim.”
“Não aceito que o que os outros esperam de uma mulher de 50+ me defina. Eu tenho tantos planos, tantos sonhos, tantas coisas para realizar ainda. Não aceito que me digam que não posso mais. Posso sim e vou atrás para realizar tudo que eu desejo!”
“Acho engraçado como essa coisa da nudez segue sendo um tabu. Da nudez feminina, na verdade. Se a gente pensar que um mamilo ainda causa um alvoroço, né? Acho que é tabu ainda porque o corpo da mulher é visto como algo do coletivo, não dela. Acho que justamente por isso, quando estávamos lançando o espetáculo, houve uma pequena comoção sobre esse momento da peça, sobre a minha nudez. Depois de estreamos, porém, isso se diluiu, o que para mim foi natural. O musical é tão mais do que a Claudia Raia nua.”
“A nudez ali serve à nossa história, queríamos mostrar que aquela criação veio de um momento íntimo, de solidão, de lidar com tantos sentimentos e parir um quadro que está na história da arte do Brasil e do mundo, que é o Abaporu. Justamente por entender a importância da cena e de retratá-la dessa maneira que topei na hora.”
“Nesse sentido, fazer a cena de nudez na peça não foi difícil. Meu corpo é meu instrumento de trabalho. E, se for necessário, não tenho problema nenhum em me despir. E isso posso usar até como metáfora: sou uma pessoa aberta para a vida.”
“O pós-parto para mim foi difícil nesse lugar: de me olhar no espelho e não me reconhecer ali. É algo muito difícil de sentir e de se abrir sobre isso também. Foi um momento de muita paciência. Falei para mim mesma: ‘Esse corpo te trouxe até aqui, te deu absolutamente tudo, agora é hora de ser paciente com ele, de entender que ele está de um outro jeito e que você vai chegar onde precisa chegar para fazer o espetáculo e fazer bem’.”
“Perder peso era uma questão também de conseguir fazer o meu trabalho da melhor maneira. Em um musical, a gente atua, canta e dança. Eu precisava estar com o corpo mais leve para fazer tudo isso. Cuidei sempre da alimentação e, quando começamos os ensaios, a rotina intensa, já naturalmente fez com que o corpo fosse se transformando e mudando.”
“Sou curiosa! Acho que essa é a fonte da juventude: querer viver. Não acho que voltei ao meu corpo de antes, porque isso nem é possível. Mas hoje me reconheço no espelho, agradeço sempre a tudo que meu corpo me proporciona.”
“Fiquei tão orgulhosa de ver os dois em Cannes e de saber que eles também estão indo por esse caminho das artes. Sophia estuda cinema em Nova York e Enzo está dando seus passos no audiovisual, começando a produzir alguns projetos.”
Post original através de gshow.globo.com
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