Teatro Barreto Júnior se encontra abandonado desde 2017
O Teatro Barreto Júnior, na cidade do Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife, é uma referência cultural desde os anos 90, mas se encontra fechado para uma reforma que já dura mais de 10 anos.
Clóvis Maia | Redação Pernambuco
CULTURA – José do Rego Barreto Júnior foi um ator e diretor de teatro cabense, nascido em 1903, tendo sido um dos nomes mais importantes do teatro brasileiro. Em 1923, ele participou de Retribuição, longa-metragem mudo, produzido por Gentil Roiz e Edson Chagas, o primeiro filme produzido em Pernambuco. Com o teatro, criou diversas companhias e grupos teatrais e foi pioneiro ao montar peças nas periferias, o que lhe rendeu notoriedade e respeito, sobretudo por estarmos falando de um Recife dos anos 40 e 50, cheio de dificuldades sociais e econômicas.
O ator morreu no ano de 1983 aos 79 anos. No ano de 1985 duas obras foram inauguradas em homenagem ao artista: dois teatros que levavam o seu nome, um no bairro do Pina, no Recife, e outro no Cabo de Santo Agostinho, sua cidade natal. O Teatro Barreto Júnior do Recife resiste até hoje, sendo uma referência para todo o teatro e a cultura no nordeste. Já o do Cabo, está abandonado desde 2017.
Um teatro abandonado na cidade mais violenta de Pernambuco
De acordo com o último Anuário de Segurança Pública, divulgado em 2023, Pernambuco possui 5 das 50 cidades mais violentas do país. A pesquisa levou em consideração as cidades com mais de 100 mil habitantes e não é a primeira vez, infelizmente, que a cidade de Cabo de Santo Agostinho entra nesta lista.
No capitalismo, não é de interesse que a juventude e a classe trabalhadora tenham acesso a uma cultura crítica e consciente. Sem acesso à cultura e à perspectiva, infelizmente, temos que ver a juventude tendo suas vidas ceifadas pela violência. Muitos desses jovens sequer tiveram a oportunidade de assistir a uma peça teatral, ir a um show ou mesmo ver um filme no cinema.
Inaugurado em 1985, o Teatro Barreto Júnior do Cabo foi palco de grandes festivais, mostras teatrais e um espaço de resistência. É dessa época que surgem a Associação Cabense de Teatro Amador (ACTA), a Mostra Cabense de Esquetes e Poesias Encenadas (MOCASPE), entre outros.
No ano de 2017, com o teatro já fechado para uma reforma que nunca começou, o Teatro, esquecido pelo poder público desde 2013, foi atingido por um incêndio, deixando a situação ainda mais difícil.
Segundo José Antônio Alves, ator, diretor de teatro e um dos pioneiros no teatro cabense nos anos 80, “Eu acho uma coisa muito triste para um município como o nosso, que sempre teve um movimento teatral que se destacava na região metropolitana do Recife, e seu único espaço para o desenvolvimento do teatro na cidade está fechado. O Cabo hoje tem uma academia de letras, o Cabo tem um movimento teatral, mas ninguém pode mais montar uma peça no Cabo. Tem um auditório, mas não é um teatro. Entra prefeito, sai prefeito e nada. É uma falta de sensibilidade muito grande do poder público. Você vai ao Agreste, em Caruaru, com quatro teatros. O Cabo, com a importância e tamanho da economia que tem, não tem o seu Teatro funcionando. Garanhuns tem teatro, Arcoverde, Serra Talhada, Triunfo tem teatro, e o Cabo não tem mais o seu. E o Cabo sempre foi vanguarda da produção, da montagem de espetáculos teatrais, é muito triste isso. É lamentável.”
Organizar a cultura para transformar a realidade
Em março do ano passado a militância da Unidade Popular na cidade iniciou o projeto Intervenção Cultural, com a proposta de reunir artistas locais para debater, apresentar seus trabalhos com o intuito de resgatar essa história de resistência cultural na cidade. Com encontros quinzenais ocorrendo no Parque dos Eucaliptos, no bairro de Ponte dos Carvalhos, o projeto foi de março a novembro de 2023 e deve voltar agora em junho desse ano. Como pano de fundo e motivação para levantar a pauta da arte em oposição a toda onda de violência no município, a reivindicação para que o projeto de revitalização e reforma do espaço do Teatro Barreto Júnior saia do papel e da promessa.
Outra voz sobre a questão da cultura na cidade é de Rúbia Maria, professora e atriz cabense: “Eu não tenho história com o Barreto Júnior, acredito que só entrei lá uma vez. Fiz teatro no Cabo com o grupo Professores em Cena, mas infelizmente o espaço do Barreto Júnior já estava destruído. Aqui não é uma cidade que entenda o valor de espaços de cultura e de lazer para o crescimento da população, então não é de se estranhar os índices de violência”.
No capitalismo a arte é algo feito por poucos e para poucos. E um aparelho como um teatro popular, como o Barreto Júnior, prova de que é urgente e necessário pensar uma política voltada para esse olhar, vendo a arte como uma ferramenta para combater desigualdades e violências e não apenas como um gasto ou algo secundário. Quantos teatros, bibliotecas públicas e quadras poliesportivas e praças públicas teremos que ver fechar para abrir os olhos de que outra forma de enxergar o mundo é possível?
*Essa matéria é em homenagem ao jovem Widiclayson, conhecido como “Will”, professor de teatro e militante da cultura no Cabo de Santo Agostinho, assassinado por crime de homofobia em outubro de 2021, com apenas 27 anos. Will começou a estudar teatro pelo Grêmio da escola, com apenas 13 anos e desenvolvia um trabalho com jovens no município.
Post original através de averdade.org.br
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